Nem sempre a gagueira infantil é uma forma de chamar atenção, muitas vezes a realidade não é bem essa.
Uma das melhores formas de comunicação humana é a fala. Então, se a criança é capaz de falar e comunicar o que quer de forma fluente, então por qual razão ela iria cortar seu fluxo de fala, já que isso implicaria na forma dela alcançar seu objetivo final? Portanto não, a criança não gagueja para chamar a atenção. Ela gagueja porque, naquele momento, ela não conseguia ser fluente.
Neste sentido, surgem questionamentos dos pais dizendo – “Ah, mas quando ele quer, ele fala normaal!“. Mas a verdade é que a gagueira é clínica. Ninguém gagueja o tempo todo,da mesma forma, com a mesma intensidade. Então, é normal que as crianças gaguejam em alguns momentos e em outros momentos não.
Isso ocorre, inclusive, com quem não gagueja constantemente. Ninguém é 100% fluente, todo o tempo. Dependendo da situação do dia, pode-se ser mais fluente ou menos fluente. Um exemplo: se a pessoa está exausta, muito cansada e precisa conversar com alguém, é normal que ocorram alguns “bugs” na fala. Ou ainda, quando se está em uma situação muito estressante, como uma entrevista de emprego importante ou uma conversa tensa – pode acontecer da gagueira surgir, mesmo que a pessoa nunca tenha recebido um diagnóstico fonoaudiológico de gagueira. Com seu filho não é diferente.
É normal que a fluência do seu filho varie no dia a dia. Isso pode ocorrer tanto por influência da situação comunicativa (quando ele tem pouco tempo para falar e precisa falar mais rápido, por exemplo), quanto em situações que envolvam uma carga emocional grande – tanto uma carga negativa quanto em situações de excitação e felicidade, que exigem mudanças no ritmo de fala.
O importante neste cenário é observar há quanto tempo a criança começou a gaguejar e se esses episódios de gagueira vêm piorando no decorrer do tempo. Se o seu filho está gaguejando, o melhor que você pode fazer é acolhê-lo e favorecer sua comunicação. Seguem algumas dicas de como fazer isso:
Dica 1: Não interrompa o seu filho, deixe-o falar sem tentar completar a fala dele. Evite dar instruções e dicas de como ele tem que fazer para não gaguejar. Todos esses conselhos geram ressentimento e insegurança e não ajudam a falar de forma mais relaxada, pelo contrário. Com o tempo, isso fará com que a criança evite falar com medo de ser corrigida.
Dica 2: Faça contato visual, olhos nos olhos, enquanto estiver falando. O contato visual é extremamente importante na comunicação, pois conecta as pessoas e transmite verdade. Com as crianças, o contato visual é especialmente necessário por causarem um sentimento positivo de acolhimento e segurança.
Dica 3: Espere um segundo ou mais antes de responder. Essa atitude reduz a pressão do tempo na comunicação, e fará com que seu filho se sinta mais relaxado para processar o que quer dizer antes de começar a falar também.
Dica 4: Ajude seu filho a falar mais devagar. Para muitas crianças, determinadas mudanças nos pais e/ou outros membros da família são a melhor forma de estimular uma boa fluência de fala. Por isso, ao invés de ficar solicitando que a criança fale mais devagar, você deve tentar moldar a sua própria fala, estabelecendo um padrão mais lento e relaxado quando for conversar com ela. Não é necessário reduzir de forma artificial a velocidade de fala, mas criar uma atmosfera na qual a fala rápida não seja necessária. Pausas breves entre as palavras e frases são muito eficientes. Observe o estilo de vida das pessoas que convivem com a criança. Frequentemente a criança reflete o estilo de vida da família e, se esse estilo for acelerado, ela não conseguirá falar mais devagar. Para que ela consiga, será necessária uma mudança na postura da família, pois se todos falarem mais devagar ela também o fará; é uma reação natural!
Dica 5: Dê mais importância para o conteúdo do que para a forma que seu filho fala. Se ele te diz: “Mãe/Pai, eu quequequero ááááágua”, não o corrija ou peça para repetir sem gaguejar. Responda naturalmente: “Você quer água, filho? O papai pega água para você”. Dessa forma, você demonstra mais interesse em suprir suas necessidades do que em corrigir sua fala e, ao mesmo tempo, oferece um modelo de fala adequado quando repete o que ele pediu sem gaguejar.
Dica 6: Ouça com paciência. Espere que seu filho termine de falar antes de responder. Observe se você não está apressando para terminar de falar logo. Não tente adivinhar o que ele vai dizer e completar a frase antes que ele termine. Fale com o seu filho e não POR ele.
Dica 7: Você não precisa fingir que não percebe a gagueira, especialmente se seu filho se mostrar incomodado e irritado quando tenta falar e não consegue. Converse com ele sobre isso e dê apoio. Nada de bullying e piada ou permitir que outros membros da família e amigos façam isso também. Lembre-se: o lema é acolher!
Dica 8: Acolher não é o mesmo que superproteger – deixe a criança se comunicar! Quando ela tomar iniciativa de falar para fazer um pedido no restaurante ou relatar algo para alguém, por exemplo, não fale por ela. É justamente se colocando na posição de falante que ela vai se sentindo cada vez mais confiante para falar, mesmo que gagueje em alguns momentos.
Dica 9: Reserve um tempo, diariamente, para dar atenção exclusiva ao seu filho. A fala mais lenta e relaxada pode ser mais eficaz quando a criança tiver algum tempo de atenção dos pais só para ela, sem distrações e sem ter que competir com outras pessoas.
Dica 10: e mais importante: procure ajuda de um fonoaudiólogo especialista em fluência ou que tenha experiência em atender os casos de gagueira.
Gagueira não é brincadeira, nem artifício para chamar a atenção. Gagueira é um distúrbio que tem tratamento e quanto antes iniciar, melhores serão os resultados!
Fonte do texto: Paula Moura Fono.